Jornal da Cidade de Bauru / SP
O custo equivale ao que a indústria de transformação desembolsa por ano com a folha de pagamento, afirma a Fiesp
Renée Pereira
A cada hora, cinco novas
regras tributárias chegam à contabilidade das empresas brasileiras. Para
colocá-las em prática, um batalhão de profissionais é acionado,
softwares são alterados e planilhas refeitas. No fim do dia, a maratona
para ficar em ordem com o Fisco já corroeu 1,16% do faturamento da
empresa no período. Em um ano, a conta fica salgada. Levantamento da
Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) mostra que as
empresas gastam R$ 19,7 bilhões só com a burocracia do sistema
tributário.
O custo equivale ao que a
indústria de transformação desembolsa por ano com a folha de pagamento e
supera em 58% o investimento em pesquisa e desenvolvimento, revela o
estudo. Intitulado "Carga Extra da Indústria Brasileira", o trabalho
mostra o quão pesado é o gasto da indústria para preparar o pagamento de
um tributo e honrar outros compromissos com a União, Estados e
municípios.
"Custa caro manter o
complexo sistema tributário brasileiro. Não bastasse a elevada carga de
impostos e contribuições, que na indústria chega a 40,3% dos preços dos
produtos, as companhias também têm de arcar com essa despesa adicional",
afirma o diretor do departamento de competitividade e tecnologia da
Fiesp, José Ricardo Roriz Coelho, coordenador do estudo. Segundo ele,
até chegar ao consumidor final, considerando a cumulatividade da cadeia
produtiva, os gastos com o sistema podem chegar a 2,6% do preço dos
produtos industriais.
O maior custo das
empresas é com pessoal. De acordo com o estudo, são dez funcionários
para realizar cada atividade, como folha de pagamento, escrituração
fiscal e contabilidade. "Na minha empresa, há um batalhão de pessoas
trabalhando pra valer nessas áreas", afirma o diretor Saulo Pucci Bueno,
membro do conselho de administração do Grupo Amazonas, que produz
solados e saltos de borracha. Ele conta que só na contabilidade são 15
pessoas, que gastam quase 30% do tempo de trabalho preenchendo papéis.
Além disso, como o
sistema tributário é complexo e suas regras mudam diariamente, a empresa
mantém outros seis funcionários para auditar o trabalho feito pela
contabilidade. Apesar de a maioria das atividades serem eletrônicas,
Bueno diz que ainda há muita coisa em papel. "Exemplo disso é que
mantemos um prédio só para o arquivo morto e dois funcionários para
organizar toda papelada. E eles trabalham bastante."
Não falta serviço também
para o pessoal de tecnologia da informação (TI). A cada mudança, os
programas precisam ser revisados e alterados, afirma o superintendente
da Dimep Sistemas, Delfim Ferreiro. "Pelo menos um terço do tempo de um
profissional de TI é dedicado para às áreas ligadas a encargos e
tributos." A empresa, que trabalha com relógios de ponto, tem nove
filiais. Na prática, isso representa se enquadrar em todas as regras
estaduais e municipais onde estão localizadas. Para cada uma delas, há
espelhamento da parte fiscal.
"Todo mundo quer mais
recursos e criam regras distintas para ficar com uma fatia da
arrecadação", diz Rinaldo Dini, dono da Metalzilo, que há 60 anos
fabrica armações de óculos. O empresário conta que, além de auditoria,
mantém contrato com um escritório jurídico para assessorar a equipe
interna em relação às mudanças da legislação em todas as regiões e
interpretação das regras. "Se houver algum errinho, serei notificado e
pagarei multa."
Multas
Esse é outro custo do
sistema tributário que atormenta as empresas e provoca gastos de R$ 1,41
bilhão por ano. Em alguns casos, é o Fisco que recorre à Justiça para
cobrar débitos que supostamente as empresas não pagaram. Outras vezes
são elas que contestam cobranças indevidas. "Grande parte das regras não
é clara, deixa dúvidas e acaba aumentando os questionamentos
judiciais", avalia Alfried Plöger, da Melhoramentos.
Na avaliação dele, a
quantidade de leis, normas e instruções nos Estados, municípios e
federação é tão grande que não há ser humano que conheça todas as
regras. Por isso, diz o empresário, as empresas precisam de equipes
robustas para executar e fiscalizar as operações. "É uma burocracia
interna fantástica."
A percepção de Plöger
também está estampada nos dados do Instituto Brasileiro de Planejamento
Tributário (IBPT): em média, cada empresa no Brasil tem de respeitar
249.124 normas tributárias. Segundo a vice-presidente do instituto,
Letícia Mary Fernandes do Amaral, a maior parte (137.017) se refere a
regras municipais. "Isso representa obrigações extras, que se não forem
atendidas podem resultar em multas para as empresas."
Em outros países, diz
ela, o sistema é muito mais simplificado. A comparação já foi feita
algumas vezes pelo empresário Jorge Gerdau. Segundo ele, enquanto nos
Estados Unidos apenas duas pessoas são responsáveis pela área
tributária, no Brasil são necessárias centenas de pessoas para calcular
os impostos pagos ao governo. A grande preocupação para executivos e
empresários é que a situação está se deteriorando, em vez de melhorar.
Em 1988, eram 29.713 normas tributárias - agora são 249.124.
Pequenas empresas são mais penalizadas com impostos
As pequenas empresas são
as que mais sofrem com a burocracia tributária no Brasil. Os custos para
pagar impostos e contribuições têm peso maior comparado às grandes
corporações: representam 3,13% do faturamento. As empresas médias
desembolsam 1,64% da receita para preparar o pagamento dos tributos e
cumprir a legislação. Nas companhias de grande porte, o gasto é de 0,83%
do faturamento.
"Uma empresa menor não
consegue mais manter equipes internas para contabilidade e encargos
trabalhistas", destaca o diretor-presidente da Escovas Fidalga, Manoel
Canosa Miguez. Ele conta que a empresa, que tem quase 60 anos de
existência, transferiu para um escritório de contabilidade todas as
atividades fiscais e de recursos humanos. "Fica mais barato do que
manter uma equipe interna."
De acordo com o estudo
Carga Extra na Indústria Brasileira, da Federação das Indústrias do
Estado de São Paulo (Fiesp), só o custo de terceirização dos serviços
representa custo anual de R$ 1,17 bilhão para as pequenas empresas, ou
0,75% do faturamento. Nas companhias de médio porte, o gasto é menor: R$
620 milhões (0,25% das receitas).
Para empresários e
especialistas, a reforma tributária tão almejada pela sociedade não pode
se limitar a reduzir alíquotas de impostos, contribuições e encargos.
Fonte: Fenacon
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