sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

A praia, o som e os economistas - algumas lições de análise econômica aplicadas ao dia a dia


Cristiano Oliveira*

Certa vez, quando perguntado a respeito do porquê de os economistas discordarem tanto, o atual prêmio Nobel em economia Paul Krugman respondeu que estes concordavam em 99% dos assuntos, mas os jornalistas insistiam em perguntar a respeito do 1% em que havia discórdia. Tenho acompanhado neste jornal a polêmica do som na praia e acredito que neste caso os economistas podem contribuir para o debate sem discordância. 

Em primeiro lugar, a praia é um bem público, ou seja, qualquer pessoa pode utilizá-la sem que isso implique não-utilização por outros. Todavia, a praia é um bem público limitado sujeito a congestionamento, pois há uma limitação física do espaço e o acúmulo de pessoas em um mesmo espaço gera o que chamamos de externalidades. Externalidades são os custos ou benefícios que podem acontecer pela atitude de outras pessoas. O som na praia é um bom exemplo de externalidade. A discussão até então dividiu a população entre os que acreditam que este é algo ruim e, portanto, uma externalidade negativa (um custo) e outros que acreditam que este é algo bom, uma externalidade positiva (um benefício). É possível chegar a um consenso? Provavelmente não, mas podemos procurar um equilíbrio que seja melhor para todos que frequentam a praia, pois hoje há claramente um desequilíbrio em que os que gostam do som na praia estão sendo beneficiados em detrimento dos demais. 

O melhor equilíbrio é aquele em que há um mercado para as externalidades. Neste caso, as pessoas que gostam do som na praia, tanto as que colocam quanto as que somente gostam e consideram um benefício teriam que pagar um valor para as pessoas que não gostam do som e se sentem prejudicadas no seu lazer. Qual seria o valor? Isto dependeria da oferta e da demanda, mas quanto mais pessoas não gostarem do som maior deverá ser o valor total pago. No entanto, este equilíbrio é de difícil implementação e seus custos de transação são muito altos, pois haveria a necessidade de alguém que coloque o som na praia negociar com todos aqueles que se sentem prejudicados e isto poderia levar o dia inteiro e, desta forma, ninguém aproveitaria o dia de praia. O prêmio Nobel em 1991 Ronald Coase identificou este problema. Segundo ele, quando há excessivos custos de transação não há como resolver um problema de externalidades via mercado. 

O instrumento mais utilizado nos casos de ausência de um mercado para externalidades negativas e que pode ser aplicado ao som na praia é o da taxação. Isso já é aplicado em crimes contra o meio ambiente e os leitores já devem ter ouvido falar de empresas que são multadas quando os mesmos ocorrem. Neste caso, não há como definir quem foi prejudicado e/ou mensurar o tamanho da degradação feita ao meio ambiente e a multa substitui o mercado retirando um valor do gerador da externalidade que é repassado a toda sociedade, que seria compensada com mais recursos para saúde, educação, etc. O mesmo raciocínio vale para o caso do som na praia, portanto, cabe ao Legislativo estabelecer limites e regras e ao poder Executivo multar os que violarem os limites estabelecidos por lei e compensar a população na forma de mais fiscalização e maior oferta de serviços públicos com os valores arrecadados. Se ninguém violar a regra, não há externalidade e, portanto, não existem nem beneficiados e nem prejudicados e o dia de praia é aproveitado por todos sem conflitos.
Fonte: www.jornalagora.com.br

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