Contribuintes têm conseguido no Judiciário e na esfera
administrativa cancelar autuações fiscais contra o aproveitamento de créditos
de ICMS obtidos em compras de mercadorias de fornecedores que, meses ou até
mesmo anos depois dessas operações, tiveram suas inscrições estaduais cassadas
pela fiscalização.
A situação é comum, apontam advogados e conselheiros do Tribunal
de Impostos e Taxas (TIT) de São Paulo, apesar de o Superior Tribunal de
Justiça (STJ) já ter se posicionado pelo menos uma vez contra a prática.
"Isso é péssimo para o contribuinte, que tomou os cuidados na aquisição e,
mesmo assim, teve os créditos cancelados", diz o advogado José Eduardo
Toledo, do Neumann, Gaudêncio, McNaughton e Toledo Advogados.
Recentemente, um caso envolvendo o tema foi analisado pelo
Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), que concedeu uma tutela antecipada
(espécie de liminar) a favor de um contribuinte. O processo envolve uma
companhia do setor de perfumaria e cosméticos, que entre setembro e dezembro de
2008 adquiriu mercadorias de um determinado fornecedor.
O fornecedor, entretanto, foi considerado inidôneo em novembro
de 2009. Posteriormente, a autora da ação teve os créditos de ICMS relacionados
às operações cancelados pelo Fisco. De acordo com o advogado do contribuinte,
Sandro Machado dos Reis, do escritório Bichara, Barata & Costa Advogados, o
valor da autuação hoje giraria em torno de R$ 3 milhões. "Na época da
operação, a inscrição estadual do fornecedor estava regular, e não havia
nenhuma restrição da Fazenda paulista", diz.
O advogado critica o fato de a companhia ter sido penalizada,
apesar de ter recolhido o ICMS devido na operação. "Não houve nenhum
descumprimento da obrigação principal e, mesmo assim, gerou uma contingência
desse tamanho", afirma Reis.
O processo foi julgado pela 6ª Câmara de Direito Público do
TJ-SP no fim de agosto. Na decisão, o relator do caso, desembargador Reinaldo
Miluzzi, diz que a autora da ação agiu de boa-fé ao adquirir as mercadorias, e
concedeu a tutela antecipada para impedir a Fazenda do Estado de São Paulo de
executar a dívida. "Não havia como a autora saber da situação irregular
daquela empresa [fornecedora]", destaca Miluzzi na decisão.
Por meio de nota, a Secretaria da Fazenda de São Paulo informou
que o cancelamento dos créditos discutidos no processo foram mantidos
anteriormente pelo Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) do Estado. O órgão
afirmou ainda que na época a autora do processo não conseguiu comprovar que as
operações com o fornecedor realmente aconteceram. "Houve a simulação da
existência da empresa que emitiu as notas fiscais que fundamentaram o crédito
da empresa autuada. Assim, não há que se falar em irretroatividade, posto que a
suposta emitente da documentação fiscal nunca esteve em situação regular perante
o Fisco", diz.
Um caso similar foi julgado em agosto pela 16ª Câmara Julgadora
do TIT. O processo administrativo analisado envolve a Casas Pernambucanas, que
conseguiu anular um auto de infração de R$ 19 mil.
De acordo com a decisão, a companhia realizou, entre maio e
outubro de 2003, operações com um fornecedor, que posteriormente teve a
inscrição estadual cassada. A autuação, entretanto, foi suspensa porque a
empresa conseguiu comprovar que as operações realmente aconteceram e o
fornecedor estava regular na época da compra. Por meio de nota, a Casas
Pernambucanas informou que não comentaria o caso.
No TIT, de acordo com o advogado César Temer Zalaf, que atua na
4ª Câmara Julgadora, há decisões contra e a favor dos contribuintes. "Há
julgadores que entendem que o fato de a empresa que emitiu nota não estar em
atividade é suficiente para que aquele documento fiscal seja declarado
nulo", afirma.
A advogada Valéria Zotelli, do Miguel Neto Advogados, recomenda
aos seus clientes que guardem o máximo de documentos possíveis que provem que
as operações efetivamente ocorreram e que o fornecedor estava regular no
momento da venda. "Falamos para, pelo menos uma vez por mês, imprimir o
Sintegra para provar que aquele fornecedor estava regular naquele
momento", diz.
A questão já foi analisada pelo STJ, que decidiu em 2010 que uma
empresa de Minas Gerais poderia se aproveitar de créditos de ICMS de uma operação
feita com um fornecedor posteriormente considerado irregular. O relator do
caso, ministro Luiz Fux, entendeu que desde que o contribuinte prove sua
boa-fé, o creditamento é legal.
Por Bárbara Mengardo | De São Paulo
Fonte: Valor Econômico
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