segunda-feira, 9 de abril de 2012

Novo ponto eletrônico foi criado para minoria, diz especialista

Por Claudia Rolli
"O Brasil está regulando pela exceção." A afirmação é da professora Luciana Yeung, do Insper, ao se referir à implementação do novo sistema de registro de ponto eletrônico, com data para entrar em vigor a partir do dia 2 de abril.
Segundo a professora, os problemas com fraudes na marcação de ponto - um dos principais argumentos do governo para a adoção do novo sistema --são mínimos. "São exceção, não maioria."
São obrigadas a instalar esse novo sistema todas as empresas que já utilizam o ponto eletrônico e tem mais de dez empregados, como prevê a portaria 1.510 do Ministério do Trabalho, editada em agosto de 2009.
Pesquisa feita nos dois dos maiores tribunais do Trabalho do país, São Paulo e Rio Grande do Sul, durante dez anos mostrou que o percentual de processos trabalhistas com fraudes na marcação é "mínimo", segundo mostrou reportagem da Folha publicada no último sábado (Brasil burocrático - Ponto eletrônico muda e amplia o custo de empresas)
Em São Paulo, foram estudadas 850 mil ações no período de janeiro de 2001 a maio de 2011. Desse total 340 mil (40%) estavam relacionadas a problemas de horas extras.
O número de processos com fraudes no ponto eletrônico foi 4.250 --ou 0,5% do total pesquisado em dez anos. Se consideradas somente ações com problema da jornada, o percentual com fraudes na marcação de ponto sobe para 1,2%.
No mesmo período, foram analisados 560 mil ações trabalhistas no Rio Grande do Sul, e 196 mil (35%) eram referentes a excesso na jornada.
Os processos com irregularidades na marcação de ponto foram 3.920 --ou 0,7% do total pesquisado. Levados em conta os processos com problema de jornada, o percentual com fraudes na marcação de ponto sobe para 2%.
As informações foram obtidas pela Folha e fazem parte de um estudo que será publicado em breve por seus coordenadores: a professora do Insper e o professor Hélio Zylberstajn, da USP.
Os setores identificados no levantamento com problemas na marcação de ponto foram o financeiro e comércio.
"A intenção do ministério é boa ao proteger o trabalhador e permitir que ele tenha em mãos o controle de suas horas trabalhadas, mas causa transtornos. E faz com que a maioria pague por uma minoria que cometeu fraudes com a marcação da jornada", diz o advogado Walter Nimir, do escritório De Vivo, Whitaker, Castro e Gonçalves Advogados.
"O governo está interessado em facilitar o trabalho da fiscalização, sem se importar se isso trará ônus às empresas", diz o advogado Ricardo Matias, do Viseu Advogados.
OUTRO LADO
O Ministério do Trabalho informa que 100 mil empresas já compraram o novo equipamento necessário para mudar o sistema de registro de ponto eletrônico e se cadastraram em seu site.
Ao menos 400 mil empresas do país de vários setores terão de implementar novos equipamentos que permitem a impressão de comprovantes de entrada, saída e intervalos no trabalho.
Para Renato Sant'Anna, presidente da Anamatra (associação dos juízes trabalhistas), o sistema é bom para patrões e empregados porque poderá diminuir as ações trabalhistas. "Nove em cada dez ações hoje pedem o pagamento de hora extra, entre outros itens."
A arrecadação de encargos sobre as horas extras realizadas e não pagas ao trabalhador também preocupa o governo, na avaliação do juiz.
Levantamento da Secretaria de Inspeção do Trabalho, do ministério, mostrou que R$ 20,3 bilhões referentes a horas extras podem deixar de ser pagas aos trabalhadores por ano. Ainda segundo o estudo, feito com base Relatório Anual de Informações Sociais (Rais), pode chegar a R$ 4 bilhões o total de encargos não recolhidos, como contribuições previdenciárias e Imposto de Renda, sobre as horas não pagas.
Há cinco projetos no Congresso em tramitação para regular ou sustar a portaria que disciplina o ponto eletrônico. "Não se pode acusar genericamente todos de fraude. Os empresários não devem temer o sistema. Deveriam ser os primeiros a defendê-lo", diz Sant'Anna.
CRÍTICAS
Empresas do setor industrial, do comércio, do setor de serviços e instituições do setor financeiro criticam o novo sistema. Segundo os empresários, haverá mais burocracia, custos e conflitos entre patrões e empregados.
Também informam que a medida pode afetar a produtividade, com a formação de filas e atraso na produção até que cada empregado imprima seu comprovante impresso no novo sistema.
Sobre essa reclamação, o ministério informa que há equipamentos no mercado que demora para a impressão é de 0,2 segundos por pessoa.
Para Magnus Apostolico, superintendente de relações trabalhistas da Febraban (federação do bancos), o Ministério do Trabalho poderia permitir que os atuais sistemas de ponto fossem auditados pelos certificadores do novos sistemas, para mostrar se não ou não vulneráveis a fraudes na jornada.
"Assim evitaria que as empresas tivessem mais custos ao ter de alterar seus sistemas já integrados de marcação de ponto com folha de pagamento e setor de recursos humanos. As empresas tiveram gastos de milhões com softwares customizados e desenvolvidos para cada empresa. Seria uma medida mais inteligente", diz.
Fonte: Folha de São Paulo

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